DOLCE VITA
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                                   ESCRITORES EM LIQUIDAÇÃO
 




 
O salão imenso e abarrotado lembrava uma feira livre. No entanto, ao invés de barracas de frutas, verduras e legumes, em cada estande, escritores gritavam os títulos dos seus livros. Imploravam leitores! A todo momento, uma sirene anunciava os preços em queda livre.

 
Caminhei com alguma dificuldade entre os mais afoitos. Uma promoção relâmpago no final do corredor, despertava a atenção dos consumidores. Ali, um autor equilibrava-se em pernas gigantescas de madeira, exibindo um cartaz enquanto urrava ao microfone:
 

- Aproveite! Válido apenas por cinco minutos! Pague um e leve dez livros!

 
Algumas pessoas corriam e uma delas, atrás de mim, afoita demais, quase leva meu ombro para não perder a barganha literária!

 
Atônita, tive a sensação de ouvir alguém sussurrar. Observei ao redor. Lá estava ele! Pálido e magricelo, com um dos seus livros na mão. Sorri constrangida enquanto o escritor grisalho, ao redor dos 80 anos, apontava o título na capa. De repente, passou a falar no tom de voz mais elevado que sua rouquidão permitiu:
 

- Leia! Aqui! "Vida inglória de um espião depressivo"! O melhor romance policial do século!
 

Naquele exato instante fui interrompida, mais uma vez, pela voz da minha imaginação:

 
- É a sua chance! Grita! Grita também, Dona Escritora!

 
- O que é isso, imaginação? Pirou de vez?

 
- Dona Escritora, reaja! Veja a truculência desse mercado! Ficar aí parada, sem vez nem voz, é demais até para uma imaginação desmedida! Pelo amor das letrinhas do alfabeto, comunique-se! Ou então...

 
-  E o que você sugere? Liquidação "queima de estoque"?

 
- Exatamente! E antes que o nosso filme queime, tenho um ótimo título! Vai vender como água no deserto!

 
- Nem ouso perguntar!

 
- Não precisa. Vou falar assim mesmo...

 
E de repente, lá estava eu, gritando:

 
- Leia! Leia! "Escritores em Liquidação".

 
Foi a última cena que recordo. Acordei assustada com o som do despertador. Por um instante, ainda sonolenta, penso ter ouvido, novamente, a voz da minha imaginação:

 
- Graças a Deus, acordou! Nem em pesadelo você sabe sonhar! Poupe-me! Tenha compaixão pelos seus leitores! Ninguém merece!
 




(*) Imagem: Google

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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 03/07/2009
Alterado em 03/07/2009
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