O elevador fora de serviço obrigara Nina a encarar cinco lances de escada. Na portaria, o enorme relógio de parede já sinalizava um atraso de dez minutos. Enquanto subia, batizou cada degrau com um palavrão. Seu repertório particular de ofensas era mais vasto do que poderia supor.
Ainda ofegante, deitou-se no divã. O silêncio do analista soava acolhedor. Talvez, por isso, desatara a falar do pai sempre tão severo. Lembrou-se do estranho sonho que tivera com ele na noite anterior. Quando as primeiras lágrimas caíram, Nina franziu os olhos. Ela detestava chorar na presença dos outros.
Num instante de aparente fragilidade, entendeu que não sentia tristeza, mas raiva. Não de seu pai, ou das lembranças que a atormentavam. Apenas de si mesma. Afinal, por que dentro dela o tempo parecia nunca ter passado? Nina olhou para o corte que fizera em sua mão dias antes. Aquele traço inflamado na pele — e na alma — precisaria cicatrizar.
Pela primeira vez, em cinco anos de análise, rendeu-se à verdade. Porém, longe de uma grande descoberta ou uma profunda revelação, a verdade podia ser bem simples: o mundo não era cruel e nem ela, a vítima indefesa. O silêncio do analista — durante toda a sessão — parecia agora uma luz. A luz dos seus olhos. Nina teve vontade de agradecer. Levantou-se num impulso, e ainda sorria ao vê-lo dormindo atrás do divã.