Todos na vizinhança haviam se acostumado à presença do novo morador da praça, quando, numa tarde ensolarada, ele aparecera por ali empurrando uma antiga poltrona de veludo negro. O homem maltrapilho acomodava-se no móvel para discursar a respeito dos inimigos de seu reinado. Os responsáveis pelo seu exílio não passavam de sádicos tiranos.
Naquela manhã, ao sair da padaria, um dos vizinhos gritou em tom irônico:
— Bom dia, Majestade!
Enfurecido, o homem subiu na poltrona. Porém, desta vez, seu discurso não exibia o menor vestígio de saudade da realeza. Em meio a palavrões e frases confusas, o fulano destilou sua raiva contra o mundo. E pulou no chão ateando fogo ao móvel enquanto berrava:
— Cansei de ser rei. Abaixo a monarquia!
A poltrona ainda estava em chamas no instante em que uma bela mulher, moradora do bairro, atravessou o jardim da praça, parando ao lado do sujeito:
— Que pena! Seu trono era tão bonito.
Pela primeira vez, desde que passara a viver naquela rua, o homem esboçou um sorriso.