Alice crescera ouvindo sua mãe dizer que as coisas importantes não se encontravam em qualquer esquina. E, após dois anos de ausência, ali estava Antonio: em uma esquina qualquer da cidade à sua espera. Ainda que tivesse pressa de reencontrá-lo, Alice caminhava devagar. A cada passo, aumentava o temor de que ele pudesse desaparecer. Mas Antonio permanecia lá. E de repente, ao alcance de seus braços: não era um sonho.
— Você demorou.
Ao ouvir a voz daquele homem, Alice colou seu corpo ao dele. E continuaria assim, se Antonio não desfizesse o abraço, afastando-a delicadamente.
— Não, Alice. Tenho alguém, agora.
Pela primeira vez ela se dava conta de que a vida dele seguira, enquanto a sua permanecia suspensa.
Antonio a encarou com uma expressão indecifávrel, antes de emendar:
— Ela é tua xará.
Imaginar outra Alice ao lado do homem que amava era mais do que uma dor. Revelava sua porção medíocre: ela sentiu uma profunda inveja.
— Você está dizendo que encontrou a Alice certa?
Antonio não parecia surpreso. Talvez esperasse por isto.
— Estou com a Alice possível.
Naquele instante, o som de uma freada brusca desviou a atenção de Antonio. Seria um sinal para que ela parasse com as perguntas? Mas Alice não se conteve:
— Você ainda pensa em mim?
Antonio a segurou pelos braços como se desejasse sacudi-la.
— Certas coisas não precisam mais ser ditas.
Havia uma ponta de raiva no tom de voz dele, no entanto, Alice insistiu:
— Pensa?
Ele soltou os braços da mulher e fez um sinal para o motorista de táxi que o aguardava do outro lado da calçada. Após abrir a porta do carro, Antonio virou-se e disse:
— Todos os dias...
Alice teve a sensação de ser jogada em um lugar silencioso onde não conseguia escutar o que Antonio dizia. O brevíssimo impulso de coragem desaparecera diante do medo de ouvir a verdade. Porém, seja ela qual fosse, era tarde demais para mudar o rumo da história.
NOTA DA AUTORA:
ESTE CONTO FAZ PARTE DE UMA SÉRIE QUE COMEÇA COM O EPISÓDIO "A CASA DOS SUSSURROS". PARA MELHOR COMPREENSÃO DO ENREDO, LEIA A SEQUÊNCIA DOS CONTOS.