A vida de Alice lembrava um filme sem muito sentido que alguém assiste somente para ver como a estranha história termina. O que aconteceria, naquela manhã de inverno, poderia ter sido uma visão, um sonho ou uma fantasia. Talvez fosse tudo isso.
Na parede espelhada do quarto, Alice, ainda sonolenta, observou a aproximação de sua imagem, que mais parecia se arrastar, no outro lado do espelho. A voz do reflexo de Alice soou entediada:
— O que você quer?
Embora tola, a resposta seria verdadeira:
— Eu não sei...
Por um momento, a imagem de Alice fixou o olhar nela, em silêncio. E então disse algo incompreensível enquanto girava o corpo para se afastar. Antes que ela desaparecesse no espelho, como costumava fazer nos últimos tempos, Alice pediu que não a abandonasse. Lentamente, a imagem virou-se em direção a Alice, e respondeu:
— Você se abandonou. Eu sou apenas o seu reflexo.
Alice encarou sua imagem como se, pela primeira vez, pudesse se enxergar. Há quanto tempo ela não se via, nem se ouvia mais? No entanto, naquele instante, a sensação de estar perdida se misturara a um sopro de esperança. O caminho de volta para si mesma seria possível se tivesse coragem.
Desde aquela manhã, a palavra tem ecoado em seu pensamento: coragem, coragem, coragem.