No estúdio envolto em névoa, as tábuas do piso estalavam com meus passos. Observei o megafone em cima da cadeira do diretor, num canto do velho cenário. Não sei por quanto tempo permaneci ali até que um homem surgisse retirando a máscara veneziana de seu rosto. Ao ver quem ele era, mal consegui balbuciar:
— Meu Deus!
— Só Federico.
Diante do cineasta que mais cultuei, eu parecia uma tola sem saber o que falar.
— Nos meus filmes ninguém tem medo de ser humano.
Respirei fundo, antes de conseguir dizer:
— Com tua arte sinto que não estou só.
Federico sorriu, e afagou a minha testa enquanto contava uma breve história:
— Quando fui receber o prêmio por "La Dolce Vita", em Cannes, uma mulher pediu pra falar comigo. Sua voz soava metálica. A ponta do nariz brilhava com o reflexo de um pedaço de metal dourado. E ela carregava um macaquinho no colo. Então a mulher me perguntou: “por que não existe ninguém normal nos teus filmes?”.
Acordei com o som da minha gargalhada. Depois do riso solto, o sonho me traria uma sensação de paz: era quase um abraço.
Obrigada, Fellini.
Grazie, maestro.
(*) A passagem no Festival de Cannes foi relatada pelo cineasta em um documentário.
(*) IMAGEM: FEDERICO FELLINI, ANITA EKBERG E MARCELLO MASTROIANNI DURANTE AS FILMAGENS DE “LA DOLCE VITA”
BOAS FESTAS 🎄🎅
BONS FILMES 🎥 🍿
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