Matilda e seu Mundo
I - O JOGO DAS CAIXINHAS
Oi! Meu nome é Matilda. Sabe por que eu gosto do meu nome? Porque sempre que eu falo como me chamo, alguém do outro lado sorri. Acho isso tão bonito! Parece que uma coisa alegre vem junto com meu nome. Isso não é super legal?
Todo nome é sempre muito legal. Tem uma porta que se abre com seu nome e você precisa descobrir que porta se abre quando diz quem é!
Acho que sou muito feliz, mas não sei bem como descobri isso. Tem uma alegria dentro de mim que não passa. Só quando acontece alguma coisa muito triste é que minha alegria fica apertadinha... senão eu sou alegre!
Gosto de olhar tudo, pegar e se não posso pegar, eu pergunto o que é. Inventei um jogo que se chama o jogo das caixinhas. É assim: a gente pergunta o que é uma coisa, então quando a gente descobre, é como abrir uma caixinha e ver o que tem dentro.
Só que tem sempre outra caixinha dentro! Esse jogo é diferente porque nunca termina! Sabe por quê? Acho que é porque a gente nunca entende tudo. Tem sempre um monte de caixinhas sem abrir. Mas esse jogo é legal porque você pode jogar sozinho ou com alguém. Como não tenho irmãos, jogo muito sozinha. Às vezes, jogo com meus pais.
Meu pai é muito ocupado mas, sempre que pode, me responde o que é aquilo que eu ainda não sei. Só que como sou muito curiosa e esperta vou logo perguntando outras coisas. Ele me disse que vou jogar esse jogo a vida inteira. E meu pai sabe das coisas! Um dia me contou que até ele tem um monte de caixinhas pra abrir.
Não é engraçado? Gente grande também pode jogar! Se você quiser jogar só precisa ser curioso como eu, olhar tudo e perguntar: o que é isso?
Viu como é fácil?
Amanhã é meu primeiro dia de escola. Acho que vou ter um monte amigos e eu não vou mais ficar sozinha.
Será que a professora é brava? Ou é boazinha? É bonita? É velha e chata? A escola é grande e cheia de brinquedos? Viu quantas caixinhas eu inventei agora?
Que sono! Ih! Tenho que rezar antes de dormir. Vou pedir pro Papai do Céu pra gostar muito da escola, da professora e dos meus amigos.
Sabe, acho que o Papai do Céu é uma caixinha muito diferente! Foi minha mãe que me contou que Ele existia. Não sei se entendi direito, mas gosto de rezar e conversar com Ele.
Você também conversa com o Papai do Céu?
II - O DIA DA ESCOLA
Hoje vou à escola. Nem dormi direito. Acho que estou com tanta vontade de conhecer coisas novas que o tempo parece ir passando bem devagarinho só pra me deixar triste!
Fico perguntando pra minha mãe se já está na hora mas ela me responde, com muita paciência, que ainda não.
Ai! Por que será que quando a gente quer ir muito num lugar o tempo não passa? Quando tenho que ir ao médico ou no dentista chega tão depressa o dia de ir! Que coisa mais chata!
Vou almoçar agora e comer bem devagarinho porque se eu comer bem devagar o tempo vai passar mais depressa. Nossa! De onde eu tirei isso?
Acho que é mais uma caixinha que eu abri sem perceber. Às vezes acontece isso comigo. Nem estou jogando mas acabo abrindo umas caixinhas e é muito divertido brincar esse jogo sem saber que está brincando!
Minha mãe me vestiu uma roupa engraçada que se chama uniforme. Não gostei! Ela disse que todos os meus amigos da escola também vão vestir isso. Aí eu perguntei pra ela:
- Por que todo mundo vai com roupa igual se todo mundo é diferente?
Minha mãe ficou me olhando e depois me disse que era assim na escola.
Eu nunca vi ninguém igual. Ah! Vi sim! Tem uma mulher na minha rua com dois filhos igualzinhos. Eles usam a mesma roupa. Mas, se eles são tão parecidos por que a mãe deles não coloca roupa bem diferente neles? A gente ia logo saber quem é um e outro porque se olhar direito eles não ficam tão iguais.
Acho que não é todo mundo que gosta de olhar tudo como eu. Minha mãe sempre me fala pra parar de olhar as pessoas na rua. Será que ela tem vergonha de olhar? Eu não tenho e gosto muito. Às vezes eu finjo que não olho mais, mas sempre dou um jeitinho de continuar olhando.
Agora estou no carro da mamãe. Ela está me levando pra escola. Disse que é bem perto da minha casa. Eu pedi pra ver antes, mas ela falou que era surpresa. Então vou ter uma surpresa agora porque minha mãe disse que estamos chegando.
Ah! É uma casa bem grande! Eu não sabia que escola parecia casa. É toda branca e tem um monte de janelas pintadas de azul. Tem um muro de desenhos coloridos de nuvens, balões e um sol bem grande. É muito bonito esse muro. Quem será que pintou?
Desço do carro e olho em volta. Vejo que tem muita gente entrando. A escola deve ser um lugar importante porque muita gente vai lá. E eu acho que sou importante se vou num lugar assim. O que será que eu vou descobrir aqui?
O portão é bem grande. Tem um homem com roupa de guarda na entrada. Que engraçado! Escola também tem polícia! Vou perguntar pro meu pai por que tem isso aqui.
Entro e vejo um lindo jardim e um parquinho com escorregador e balanço. Que legal! Escola também é um lugar de brincar! Aqui tem muitas flores: brancas, amarelas e vermelhas.
Queria pegar nessa flor amarela mas acho que não pode. Só olhar, como diz minha mãe. Que chato! Como posso saber como é se não posso pegar?
Tem uma moça na porta da sala. Acho que é a professora que minha mãe falou. Ela sorri pra mim e diz que seu nome é Beatriz. Nunca ouvi esse nome e gostei muito. Ela é tão bonita como seu nome.
Entro na sala. Tem muitos brinquedos, mesinhas e cadeiras. Tem uma coisa na parede pra pendurar a mochila. Minha professora diz que vai me mostrar meus novos amiguinhos. Eu fico feliz. Muitas coisas novas estão acontecendo.
Você também fica contente com as novidades?
III - A CLASSE
Na minha classe tem cinco meninas e cinco meninos. A tia Beatriz disse que somos dez ao todo. Aí eu perguntei pra ela se era sempre assim. Ela me respondeu que com os números é sempre assim!
Que engraçado! Essa coisa de números deve ser bem chata! Se eu quisesse mudar e pensar em outros números não podia porque é sempre de um jeito só!
Vou dizer os nomes dos meus amigos. Nome é muito mais legal que número. A gente pode inventar outros nomes e ter apelidos. Com os números eu já vi que não pode mudar nada. Acho que é por isso que a Matemática é tão difícil. O que é Matemática? Eu sei! É uma coisa de números. Já sei que não vou gostar de Matemática.
Ah! Os nomes! Viu como sou bagunçada? Começo a falar e vou falando, falando e quase me esqueço do que ia dizer primeiro. Com você também é assim?
Meus amigos se chamam Dora, Helena, Isabel, Marina, Henrique, João Paulo, Marco, Rafael e Gustavo. Gostei de todos e acho que vou ser muito amiga da Dora, da Helena e do Henrique. Não sei bem por que eu disse isso. Acho que gostei um pouquinho mais deles.
A tia Beatriz disse que a gente vai brincar de teatro e eu escolhi ser a bruxa. Ninguém queria ser a bruxa! Eu acho ela muito engraçada porque está enganando todo mundo. Não acho que ela é tão malvada. A bruxa fica brincando disso só pra assustar a gente. Então eu vou ser a bruxa que vai enganar todo mundo se fazendo de malvada, mas é só de mentirinha!
Hoje a gente brincou de desenhar e pintar. Fiz um desenho igual ao muro da escola porque achei bonito, mas não ficou igual porque é do meu jeito!
Na hora do recreio, eu, a Dora e a Helena fomos brincar no balanço. A Dora fala bastante como eu, mas a Helena só fica escutando a gente falar.
Eu já percebi que tem gente que não fala muito. Perguntei pra Helena por que ela só ficava escutando a gente falar. Ela me disse que gostava mais de ouvir. Então eu falei que se ela quisesse falar comigo eu ia ouvir tudo bem quietinha porque também gosto de ouvir as pessoas. É muito bom conversar com alguém. Parece que a gente vai ficando muito leve e, às vezes, eu sinto que as pessoas colocam coisas importantes na minha cabeça e eu fico diferente, com mais coisas pra pensar e entender.
Como a Dora é diferente da Helena! A gente fala ao mesmo tempo! Não entendi ainda como a gente consegue fazer isso. Ela é tão bonita. Tem uns olhos que brilham tanto. Eu disse pra ela que parecia um pouco do sol no olho! A Dora é uma menina muito legal. Acho que ganhei uma amiga pra sempre porque eu sei que a gente vai ter muita coisa pra conversar, até ficar bem velhinha e nem escutar direito o que uma fala pra outra. Então a gente vai se olhar, de repente, e rir muito disso!
Nossa! Eu abri uma caixinha agora que parece com o tesouro do Aladim! Brilha muito!
Esse dia passou depressa e eu descobri que essa caixinha que gente grande chama de tempo é uma coisa muito difícil de entender porque muda muito. Pode passar rápido. Pode quase nem passar de tão devagar! Mas aí eu pensei que é a gente que faz o tempo passar rápido ou devagar.
A gente pode ser um mágico que tem uma varinha e muda as coisas como quer!
Minha mãe veio me buscar e eu vi a mãe da Dora e da Helena. Quando entrei no carro, olhei pra trás e fiquei acenando e sorrindo pra elas.
Meu coração batia depressa e eu me senti de um jeito que ainda nem sei que nome tem!
Acho que esse foi um dia que eu vou guardar dentro de mim com muita alegria. Gostei muito da escola, da professora e dos meus amigos.
Obrigada Papai do Céu! Viu por que eu gosto de conversar com Ele? Ele me escuta! E você?
IV - MEU MELHOR AMIGO
Eu não disse que o Henrique ia ser meu melhor amigo? Acho que ele é o menino mais legal da escola! Vive sorrindo e fala com todo mundo de um jeito que faz a gente se sentir importante!
O Henrique é lindo! É moreno e tem olhos cor de jabuticaba. Eu adoro jabuticaba. Na fazendo do meu avô tem um pé de jabuticaba. Sempre que meus pais me levam lá eu corro até o pé e cato um monte delas pra comer na hora, sem lavar!
Minha mãe fica nervosa com isso, mas meu pai fala pra ela não ficar assim, que a gente pode comer desse jeito quando não tem veneno! Você sabia que na cidade as frutas tem um remédio na casca que é veneno? Tem que lavar muito bem antes de comer. Mas lá na fazenda do vovô não tem isso! E eu como do pé mesmo!
Então, outro dia eu falei com o Henrique que gostava de olhar no olho dele porque me lembrava a fazenda do meu avô e o pé de jabuticaba, me lembrava o que gente grande chama de liberdade!
Foi meu pai que me falou um dia dessa coisa de ser livre. Deve ser muito importante. Ele disse que na fazenda eu ficava mais feliz porque podia ir pra lá e pra cá com liberdade. Acho que liberdade é isso: ir pra onde a gente quer sem medo!
Ah! Mas eu sou muito bagunçada mesmo! Eu ia falar do Henrique e já me perdi! Não sei por que acontece isso comigo. Estou falando de uma coisa e essa coisa vira outra coisa e outra e outra! Que coisa!
Outro dia, lá na escola, os meninos foram jogar futebol no recreio. Eu falei pra Dora que adoro esse jogo e queria muito jogar. Mas os meninos riram de mim quando pedi pra jogar com eles. Aí o Henrique perguntou se eu sabia jogar. Eu inventei que sabia! Então ele falou pra todo mundo que eu podia jogar no time dele!
Os meninos não gostaram, ficaram resmungando um pouco, mas eu entrei no jogo! Antes de começar falei no ouvido do Henrique que não sabia jogar direito. Ele me olhou, sorriu e disse baixinho:
- Eu sei! Vamos jogar e ganhar deles!
Foi o melhor jogo da minha vida. Joguei de atacante! O Rafael, um menino muito legal mas muito nervoso, me chutou a perna e eu caí. Mas não chorei!
O Henrique deu um empurrão no Rafael e correu pra me ajudar:
- Dói?
- Já passou.
E ele me deu a mão pra levantar. Nosso time ganhou de 3 a 2 e eu passei a bola pro Henrique fazer o terceiro gol. Aí a gente se abraçou pra comemorar e eu falei:
- Henrique, você é o maior!
Ele sorriu e não disse nada. Mas eu sei que ele também gosta de mim e vai me proteger dos meninos bravos como o Rafael.
Nesse dia eu descobri o meu melhor amigo! E você, também tem um?
V - O JARDINEIRO
Lembra que eu contei que meu avô tem uma fazenda? Então, hoje eu vou contar a história do jardineiro que conheci nessa fazenda, quando era bem pequenininha.
O nome dele é Augusto. Ele é um velhinho de cabelo branco e voz macia. É viúvo. Viúvo é quando a esposa vai morar no Céu. Tem dois filhos bem grandes que moram em São Paulo.
Ele me disse que tem muita saudade dos filhos e cuida de suas flores como se fossem eles. Aí eu perguntei se ele amava tanto assim o jardim. E ele me respondeu que era o sentido da sua vida!
O que é o sentido da vida? Eu fiquei com vergonha de perguntar o que era isso porque parecia muito importante pra ele. Então eu fiz de conta que entendia muito bem o que era aquilo.
Muito tempo depois, conversei com meu pai sobre isso e entendi uma coisa. Sabe o que é o sentido da vida? É sentir uma coisa muito forte e alegre dentro da gente. É estar numa estrada linda e ver que o caminho está livre pra gente passar. O sentido da vida é viver com o coração cheio de amor!
Puxa! Eu sou mesmo uma menina inteligente porque tudo que meu pai explica eu entendo. E ele é o pai mais inteligente do mundo. E eu a filha mais inteligente do Universo!
É brincadeira... eu não sou a mais inteligente, mas meu pai é! E o seu, também é tão inteligente?
Ah! O jardineiro! Viu? Eu continuo com essa coisa de esquecer sobre o que estava falando primeiro. Preciso perguntar pro meu pai por que acontece isso.
Então, um dia, lá na fazenda, eu fui ajudar o Seu Augusto a cuidar das flores. Ele pediu pra eu regar as rosas amarelas porque eu falei que eram as mais lindas. Quando eu estava regando, vi que atrás do canteiro das rosas tinha um canteirinho escondido com uma flor que eu nunca tinha visto antes.
Corri pra perguntar pro Seu Augusto que flor era aquela. Ele me respondeu que se chamava camélia, uma flor muito delicada que precisa receber muito amor e carinho pra florescer. Eu pedi pra regar, mas ele me disse que não podia regar sempre. A camélia, por ser mais sensível, é muito diferente das rosas, violetas e margaridas.
Aí eu falei pro Seu Augusto que, às vezes, me sentia como a camélia no meio das rosas, violetas e margaridas.
Achei isso muito engraçado de se dizer, mas Seu Augusto, muito sério, pegou minha mão e me levou até o canteirinho das camélias. Tirou duas balinhas do bolso e deu uma pra mim.
A gente sentou no chão e ficou olhando as camélias, enquanto o sol ia indo embora e conversamos sobre as flores que nascem no jardim.
Já era quase noite quando minha mãe começou a me chamar. Então eu levantei, dei um abraço no Seu Augusto e disse que sempre que ele quisesse falar das suas flores eu ia gostar muito de ouvir.
Nesse dia eu descobri que a gente pode se parecer com as coisas que vê. Ou pode ser muito diferente. Não é engraçado? Gente parecer flor?
Com qual flor você se parece?
VI - AS CORES
Ontem, na escola, a tia Beatriz falou das cores. A gente pintou um monte de desenhos e viu que têm muitas cores diferentes.
Enquanto eu pintava, pensei nas cores de um jeito muito diferente. Acho que abri uma porção de caixinhas que me deixaram muito engraçada. Não é bem engraçada, mas quando ainda não sei o nome daquilo que eu penso ou sinto, digo que é engraçado.
O branco é a cor do dia. É quando a gente pode ver tudo como é. É a cor de quando o medo vai embora e a gente pode ver as coisas como elas são, sem susto!
O preto é a cor da noite. Me disseram que não é cor, mas eu acho que é! É quando tudo fica escuro! Minha mãe diz que roupa preta é muito chique, mas eu acho que é uma cor só pra gente grande.
O verde é a cor da fazenda. É a natureza, diz meu avô. É a cor que deixa a gente com um gosto bom dentro. Parece que deixa tudo um pouco mais fácil!
O azul é a cor do céu, do mar. É a cor das coisas grandes que ficam em cima e embaixo da gente! É muito complicado entender o azul, mas é a cor mais bonita que eu já vi! Quando eu casar vou colocar um vestido azul.
O amarelo é a cor que mais brilha. É o sol, é o ouro, é a alegria! É a cor de festa, de férias, de presentes! É quando a gente se sente como num Natal cheio de surpresas boas.
O violeta é uma cor esquisita. Eu não entendo muito de violeta. Uma vez eu ouvi dizer que violeta é uma cor do espírito! Que coisa é essa? Não sei não!
O vermelho é uma cor nervosa. Quando eu fico nervosa eu fico vermelha e também quando estou com vergonha. Ouvi falar que é cor de gente apaixonada. O namorado manda flor vermelha pra namorada. Quando eu crescer vou falar pro meu namorado que eu não quero flor vermelha não. Não gosto de vermelho! Quero flor amarela! E branca também.
O marrom é uma cor engraçada. É igual a terra onde a gente planta as coisas. Então eu acho que é importante o marrom. Mas também não é uma cor de criança. Só de gente grande!
O cinza é uma cor muito esquisita. É sem graça porque não é mais branco e não é preto ainda. Então é uma mistura que deu nessa cor boba, apagada.
Viu quantas coisas têm nas cores que a gente não percebe porque só vê a cor?!
Acho que todo mundo tem todas as cores dentro. Você é assim também, cheio de cores dentro?
VII - VAMOS AO TEATRO?
Você sabe o que é teatro? É o lugar do faz de conta. Tem uma coisa que se chama palco. É onde as pessoas ficam fantasiadas de príncipe, princesa, rei, rainha, fada e bruxa. E tem outro lugar que se chama platéia. É onde a gente fica sentado assistindo a história no palco.
Então, no domingo, meus pais me levaram no teatro pra assistir a Branca de Neve e os Sete Anões. Eu gosto muito dela. Mas acho que ela é muito boba. Ah! Por que ela não percebeu que era a madrasta malvada fantasiada de velhinha que estava dando a maçã pra ela comer?
Sabe, eu fiquei pensando muito nessa história e fui perguntar pro meu pai por que a Branca de Neve era bobinha. Aí meu pai falou uma coisa muito séria. Disse que tem gente que sente muita inveja de outras.
O que é inveja? Ih! É uma coisa muito difícil de entender. Meu pai me explicou que, às vezes, a gente não se sente assim tão bonito, tão inteligente e começa a invejar outras pessoas que são.
Aí eu perguntei pra ele por que tem gente que não se sente bem como é. Ele me respondeu que isso se chama ficar inseguro. Tem gente que precisa ouvir de outra pessoa o que ela é porque ela não acredita no que sente.
Isso tudo é complicado. Fiquei sem entender muito. Depois vi que a madrasta malvada não acreditava que era bonita e por isso perguntava pro espelho mágico.
Enquanto o espelho mágico dizia que ela era a mais bela, estava tudo bem. Ela acreditava que era. No dia que o espelho disse que era a Branca de Neve, a madrasta ficou tão brava e cheia de inveja que tentou matar a Branca de Neve.
Então eu descobri uma caixinha muito difícil de entender. A inveja nasce quando a gente não acredita na gente. E quando tem outra pessoa que nem está preocupada em mostrar nada, a gente inveja e tenta destruir.
Aí eu fiquei pensando que a Branca de Neve não é tão boba assim. Ela é bonita e sabe disso. Mas isso não é tão importante assim pra ela. Então ela pode aceitar que os outros também sejam bonitos. Ela não inveja ninguém porque ela é feliz como é.
Viu? O teatro é um lugar que a gente vai pra se divertir e pensar em coisas importantes.
VIII - UM NOVO AMIGO
Hoje não tem aula porque a tia Beatriz vai casar.
Todo mundo da classe vai no casamento dela. A tia Beatriz é uma pessoa muito bonita. Ela é legal e boazinha com a gente. Tem muita paciência e explica tudo direitinho.
Ela falou que o noivo dela se chama Fernando. Ele é jornalista. Escreve no jornal sobre uma coisa que se chama Economia.
O que é Economia? Ih! Isso é muito difícil. Parece que é uma coisa de negócios, dinheiro, sei lá... meu pai explicou mas eu não entendi nada.
A tia Beatriz disse que namora o Fernando desde que tinha 18 anos. Ela tem agora 24 anos. Então, são seis anos de namoro. Bastante né? Acho que eles são apaixonados porque sempre que ela fala nele, seus olhos ficam diferentes.
Minha mãe comprou um vestido azul pra eu colocar no casamento. Estou curiosa pra ver o vestido da noiva.
A Dora vai de vestido lilás e a Helena, de rosa. O Henrique vai de gravata borboleta e o Rafael disse que não vai colocar nada que aperte o pescoço dele!
Ai! Esse Rafael é mesmo muito engraçado. Eu adoro ele! Acho que todo mundo tem medo dele só porque ele grita. Mas eu sei que ele é assim só pra enganar a gente. Ele brinca de ser bravo e nervoso. No fundo tem um grande coração derretido.
Como eu sei disso? Ora, se não fosse assim por que ele ia gritar e ficar bravo? Ele não é louco! É bonito, inteligente e atencioso. É só a gente não ter medo do berro dele e olhar pra ele com respeito e amizade. Como ele merece ser tratado!
Viu? Tem gente que engana a gente se fazendo de bravo, de bonzinho, de chato, de palhaço, de maluquinho. Ih! Tem gente de todo jeito! Aí você escolhe que tipo de gente merece o seu afeto.
O que eu queria mesmo contar é que além do Henrique, sei que tenho outro grande amigo. E os amigos são como o tesouro do Aladim! Brilham como ouro porque é pra sempre!
IX - UM ENCONTRO
Hoje, na classe, a tia Beatriz apresentou um novo aluno.
Ele é tão bonito, mas é muito diferente dos meninos da classe. Tem cabelo comprido e usa brinco na orelha. Eu levei um susto quando ele abriu a porta da classe e entrou. Aí, ele olhou pra mim antes de olhar pros outros. Eu sorri pra ele. O susto tinha passado. Ele sorriu de volta e disse que o nome dele é Luciano. Eu falei que o meu é Matilda. E sabe o que ele falou? Que eu sou linda!
Eu já tinha ouvido os meninos dizerem que eu sou maluquinha, engraçada, inteligente e esperta. Mas o Luciano disse que eu sou linda!
Nossa! Aí eu levei outro susto! Mas esse susto foi uma caixinha muito diferente que eu abri. Nessa caixinha eu vi que não tinha nada ainda parecido pra entender. Eu nunca tinha pensado nem sentido nada assim antes.
E quer saber? Foi a melhor caixinha que eu abri porque eu percebi que nessa a gente vai colocando coisas até ela ficar brilhando muito!
A gente ficou conversando no recreio. Eu falei do meu pai, da minha mãe e dos meus amigos. E o Luciano me contou que o pai dele foi morar no Céu. Meu coração ficou apertadinho porque aí eu pensei no meu pai, que eu amo, e senti que era muito difícil não ter mais um pai. Mas como eu sou muito inteligente, disse pro Luciano não ficar triste porque seu pai morava no coração dele.
Acho que eu disse isso porque sempre que falo do meu pai é o meu coração que fica alegre. Então quem a gente ama mora no coração da gente. E isso também é pra sempre.
Quando você estiver triste pense que tudo pode ficar melhor. Lembre-se das pessoas importantes da sua vida e deixe seu coração se alegrar com isso. Você vai sentir que tudo fica mais fácil com esse amor dentro da gente.
Viu? Eu sou mesmo uma menina muito esperta! E o Luciano falou que sou linda! Ih! Fiquei vermelha. Mas eu não estou nervosa nem com vergonha.
Ai! Acho que é isso que gente grande chama de estar apaixonada! Mas eu sou muito pequena ainda pra ter um namorado. Quem sabe, quando eu crescer, encontro alguém assim como o Luciano pra ser meu namorado.
E você, já encontrou alguém especial?
X - AS FÉRIAS
As férias começam amanhã. Eu e a Dora vamos na fazenda do meu avô. A gente está tão amiga que não podia passar as férias separadas. Então, pedi pra minha mãe pra levar a Dora.
Minha mãe é muito boazinha e disse que era uma boa idéia porque assim eu ia ter uma amiguinha pra me fazer companhia.
Aí eu gritei com minha mãe:
- Ela não é uma amiguinha! É minha melhor amiga, mãe! Você não entende isso!
- Claro que sim, Matilda. E eu espero que vocês fiquem juntas a vida inteira.
- Desculpa, mãe. Eu pensei que você não me entendia, por isso eu brinquei de ficar brava.
- Eu sei, filha. Você é muito boa. Mas, às vezes, é difícil te entender. Eu acho que você me pega de surpresa e eu respondo sem pensar.
- Você quer que eu fale bem devagarinho, mãe?
- Não, Matilda. Eu só quero que você seja exatamente como é. Assim, você será feliz.
- Obrigada, mãe. Posso ligar pra Dora?
- Depois do jantar, filha. Quando você começa a falar no telefone, esquece da vida!
- Tá bom... tá bom!
Corri pra me arrumar e ouvi o carro do meu pai entrando na garagem. Desci pra sala de jantar e começamos a conversar.
Estou tão contente com as férias, mas falei pro meu pai que já estava com saudades da tia Beatriz e dos meus amigos. Queria levar todos comigo.
Aí meu pai falou que eu levava na memória e na saudade. Nossa! Que coisa bonita! Meu pai, às vezes, parece um poeta!
O que é um poeta? Ah! É um louquinho que resolve fazer a vida mais bonita, mais alegre, mais gostosa, mais importante, mais tudo! Um poeta é o que minha mãe chama de exagerado!
Eu não sei bem o que é ser um poeta. Mas também acho que nem o poeta sabe!
Boas férias pra você... com muita poesia e brincadeira.
FIM
Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 15/04/2009
Alterado em 28/08/2011