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PERTO DE UM CORAÇÃO SELVAGEM?
Falar de Clarice Lispector? Não me atrevo. Embora mantenha com seus livros uma relação íntima, amorosa e intensa. Os livros de Clarice, muitos em minha cabeceira (não consigo deixá-los na estante) estão com marcas, anotações, frases e parágrafos inteiros sublinhados. Ao lado das palavras essenciais de Lispector, minhas observações lembram gestos de aproximação com a autora e comigo mesma.
Com Clarice entendi a medida do meu despreparo para a dor, a ponto de sentir que não estava pronta para lê-la em determinado momento. Não ousava enfrentar o mergulho no sentido e atravessar o deserto doloroso para reencontrar o outro lado do (não) saber.
E assim, um susto no coração e ao mesmo tempo, alívio, renunciei à leitura de "A paixão segundo G.H.", na primeira vez que meus olhos descobriram esta obra. Seria preciso muita dor em minha alma para amansar a pretensão do conhecimento e estar "pronta" para aquele livro.
Confesso que há, sim, um contentamento herege quando afirmo que cada vez compreendo menos a vida. E devo a Clarice Lispector a aprendizagem maior sobre o valor do "não compreender". Suportar não saber é tão mais humano e real do que imaginar-se dono de verdades e capaz de entender tudo, a si e aos outros.
Não. Eu não entendo. A possibilidade de não entender, inclusive, a própria criação, é aceitar o mistério, a fragilidade, a mais humana condição. Estou sempre mais interessada em perguntas. E talvez, minha natureza pôde respirar a inquietude ao ler Clarice. E perder o fôlego, sem perder a força.
E então, quem sabe, por isso, ser é uma difícil alegria?
P.S.: Esta crônica se resume a um esboço sobre minha experiência pessoal com as obras de Clarice, sem a menor pretensão, nem compromisso com qualquer teoria acadêmica.
(*) Imagem: Google
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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 30/09/2009
Alterado em 30/09/2009
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