Textos
ESTAÇÃO DE UM PERSONAGEM SEM NOME (BVIW)
Não existe nação
sem memória...
Naquela estação desembarcou a infância e os melhores dias. Vozes suaves ecoam nos guichês da lembrança. Num piscar de olhos, cenas áridas invadem o pensamento e revelam a realidade hostil. Seu país acorda sob o manto da censura, direitos civis suspensos e prisões arbitrárias. A razão escurece, morre o sorriso e perde o fôlego no peito empaturrado de violência.
Sobrevive à crueldade das circunstâncias no refúgio fantasioso. Imagem recorrente e nostálgica da antiga estação na pequena cidade de seus avós. Nem sempre consegue viajar em liberdade neste espaço imaginário. O tempo das férias escolares encoberto pela névoa gelada da manhã. Fecha os olhos até lacrimejar as entranhas.
Na plataforma da tirania não há espaço para despedidas. Ausências penduram-se nos vagões da memória e o passageiro clandestino embarca para o exílio. Teve medo de escarrilar e perder o trem de sua história num túnel obscuro. Outros cenários contrastam o olhar opaco. Nada familiar ao redor. Laços desatados do passado e na esperança sequestrada, a sombra oca do amanhã.
Suporta a existência estrangeira respirando arte. Partituras e telas preenchem as horas. Embora não saiba mais distinguir a verdade, na alma torturada, resiste a marca da saudade: o perfume do colo amoroso. A estação do personagem sem nome ainda esboça o mistério. Sorri ao lembrar-se criança. Em suas mãos a fotografia de um menino maroto, do outro lado do Atlântico, com os sapatos empoeirados. Solas riscadas no chão de sua terra.
(*) IMAGEM: Google
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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 17/03/2010
Alterado em 17/03/2010
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