O expresso da meia noite passou ao lado das pontes de Madison com a dama do lotação no comando da locomotiva. No primeiro vagão, o cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante falavam sobre a vida dos outros sem mencionar, por pura inveja, o fabuloso destino de Amélie Poulain.
Próxima ao grupo, a secretária procurava um lugar silencioso para ler o diário de Bridget Jones: aquele sim era o diário de uma paixão. A primeira página trazia a dedicatória: “Para todos os garotos que já amei, o ano passado em Marienbad”.
A secretária esboçou um sorriso:
— Ah! Garota exemplar, me chame pelo seu nome no clube dos cinco. A época da inocência é coisa do passado. Que venham as ligações perigosas.
Em outro vagão, noivo neurótico, noiva nervosa, doentes de amor, discutiam entre gritos e sussurros, quando ela disse:
— Ou você para agora com isso ou conto tudo sobre a minha mãe desde nasce uma estrela até 2001 uma odisseia no espaço.
Os estranhos vizinhos, Fanny e Alexander, ao ouvirem a briga do casal improvável começaram a repetir sem parar:
— E o lado bom da vida? E o lado bom da vida? E o la-do bom da vi-da?
Eu, você e todos nós também gostaríamos de saber, mas voltando à história oficial…
No sinistro vagão da garota do trem e o último dos moicanos o clima era de amor à flor da pele e beijos proibidos. Mas, num piscar de olhos bem fechados, Blow-up, depois daquele beijo, a trama fantasma: eles se transformaram em amantes eternos de M, o Vampiro de Dusseldorf e da Bruxa de Blair, que não se cansava de defender as vantagens de ser invisível. (500) dias com ela provariam o contrário.
Da janela do seu vagão era possível ver as primeiras luzes da cidade surgirem no horizonte perdido. Hora de dizer:
— Adeus, Lenin. A fraternidade é vermelha.
Bem longe dali, no morro dos ventos uivantes, alguém ouviria uma voz responder:
— Adeus, minha rainha. Vou guardar para sempre o sétimo selo de sua coleção.
Era uma vez em Hollywood, onde os fracos não têm vez, a história de um casamento que durou 4 meses 3 semanas e 2 dias. O homem urso e sua esposa ninfomaníaca, o retrato de uma jovem em chamas, passaram a lua de fel perdidos na noite dentro do labirinto do fauno.
Inconformada, ela disse:
— Você me prometeu nove semanas e meia de amor em Roma, Casablanca e Manhattan.
Ele deveria responder embriagado de amor, mas foi apenas cínico:
— E a volta ao mundo em 80 dias, você não quer?
A jovem retirou a fita branca dos cabelos encarando o esposo:
— Desencanto. O segredo dos seus olhos: uma noite de sexo, mentiras e videotape.
— Você queria o quê? Um gigolô americano com cara de por quem os sinos dobram cantando na chuva?
— De repente, no último verão…
— Isso aqui não é o império dos sentidos.
Ela rebateu:
— Nem dos sonhos.
Antes do anoitecer, a mulher do homem urso pensou nele, sempre ele: o irlandês que conhecera em 1917. Sob a pele, a sintonia de amor.
Ao seu lado, o homem urso sonhava com a mulher do tenente francês. Ela, sempre ela, Kika, de salto alto, gritando:
— Ata-me!
E a noite americana terminaria assim, em clima de amor, sublime amor.
Ao ver uma linda mulher, ele sentou-se ao seu lado e não resistiu:
— Você vem sempre aqui?
Sem tirar os olhos da tela do cinema, ela respondeu:
— Só quando quero me lembrar que o amor pode dar certo.
— Bom dia, Vietnã.
— Hiroshima, meu amor.
— Sem novidade no front?
— Paris está em chamas. Mas o grande Lebowski saiu do clube da luta e tá curtindo a vida adoidado em Paris, Texas.
— E além da linha vermelha?
— Relatos selvagens. Em Roma, cidade aberta, invasões bárbaras do incrível exército de Brancaleone.
— Bastardos inglórios.
— E la nave va mar adentro...
— De volta para o futuro.
— Rede de intrigas: todos os homens do presidente contra Blade Runner. O caçador de andróides capturou os imperdoáveis Bonnie e Clyde. Num golpe de mestre, Django Livre fugiu.
— Pulp Fiction de Cinema Paradiso. Como diria Priscilla, a rainha do deserto: do mundo nada se leva.
— Mas quem disse que a felicidade não se compra?
— Doutor Jivago no Bagdá Café, antes do amanhecer.
— Jurava que era Lawrence da Arábia, sob o céu que nos protege.
— O céu pode esperar. Adivinha quem vem para o jantar no Festim Diabólico?
— Julieta dos Espíritos?
— Rocco e seus irmãos ladrões de bicicleta.
— Meus caros amigos do sindicato de ladrões.
— Feios, sujos e malvados.
— Os brutos também amam.
— Eles não usam black tie.
— Mas são loucos de paixão por laranja mecânica e morangos silvestres.
— Ah! O esplendor na relva: como era verde meu vale, os pássaros, um sonho de liberdade.
— A liberdade é azul.
— Veludo azul?
— Quanto mais quente, melhor: instinto selvagem e atração fatal.
— A primeira noite de um homem a essa hora? Tempo de despertar.
— Ah! Malvada! O amor não tira férias.
— Bye Bye Brasil.
— Hasta la vista, baby.
FILMES QUE AMAMOS
— Boa noite, Cidadão Kane.
— Olá, Dr. Fantástico.
— Qual a intriga internacional de hoje?
— Pergunta malvada. Responderei apenas com uma condição: não quero uma palavra sequer sobre o curioso caso de Benjamin Button.
— Prefiro viver acossado nos embalos de sábado à noite ou vender bicicleta pra ET.
— Isto é um pacto de sangue?
— Se preferir, também sinistro.
— Então, é o seguinte: dizem que o poderoso chefão dançou o último tango em Paris.
— É tudo verdade?
— Uma grande ilusão. Aquele corpinho tá mais pra crepúsculo dos deuses do que sinfonia em Paris.
— Um corpo que cai.
— É a regra do jogo.
— E assim caminha a humanidade nessa fogueira de vaidades.
— Os incompreendidos tempos modernos.
— E o discreto charme da burguesia não é mais o mesmo.
— Uma janela indiscreta, mas o pecado mora ao lado.
— Ah! Se meu apartamento falasse.
— Ran?
— E o vento levou sua inteligência ou só o brilho eterno de uma mente sem lembranças?
— O enigma de Kasper Hauser.
— Mais um estranho no ninho.
— No entanto, a vida é bela.
— Em algum lugar do passado.
— Tarde demais pra esquecer.
— A flor do meu segredo é a rosa púrpura do Cairo.
— A bela da tarde.
— Gilda, Laura ou Lolita?
— Se bobear até Carrie, a estranha.
— Minha paixão é Sabrina.
— Prefiro a bonequinha de luxo.
— Ontem revi Despedida em Las Vegas. Imagine que para muitos o filme é um porre.
— Se fosse só um porre, o fígado do cara estava salvo.
— Por falar em porre, o uísque aqui é ótimo.
— Qual o nome desse boteco mesmo?
— La Dolce Vita.
— I’ll be back.